segunda-feira, 7 de maio de 2012

Anita e os homens



O desamor atirou-a para as esquinas da cidade onde os carros paravam com propositada distracção para evitar eventuais encontros com polícias barrigudos que sacassem das algemas e do cacete e lhes amortecessem a erecção com meia dúzia de palavras cuspidas em realces de oclusivas convictas. Entrava em carros desconhecidos sem pudor ou medo e desprendia-se do corpo entre camas sujas e cigarros apagados nas costas das mãos. Os homens existiam num vai e vem de pénis e vaginas e de entrar e sair pela porta das traseiras envergonhados pela mulher e os filhos que subitamente lhes assomavam na memória e a quem vagamente justificarão o sumiço com histórias de trabalhos súbitos e emergências amigáveis de cujos nomes a mulher nunca ouviu mas cristalizada na bolha de perfeição familiar beija o marido nos lábios e na língua que vinte minutos antes lambiam avidamente o ânus da Anita.

Anita sorria distraidamente pela janela enquanto relembrava a destruição que facilitava. Os casamentos arruinados por cartas que enviaria com detalhes mórbidos de fantasias sexuais que concretizava apenas para exibir a sexualidade que as esposas castravam, na busca incessante do papel de cristã púdica que beija o resto do pão antes de o atirar ao lixo, numa culpa de classe média que podia mandar o resto do pãozinho para África e cessar a fome de uma criança. Denunciava os maridos por desprezo pelas relações, não antevia desfechos floridos para o seu papel, apenas procurava exterminar o absurdo do casamento, as entrelinhas caladas dos votos, que ditam que para a vida e para a morte se suportará a porrada e a ofensa com a porta fechada e sorrisos abertos em desfiles programados na rua, enquanto o marido esfrega os olhos endiabrado com as pernas da vizinha do terceiro andar que podia foder todos os dias, mas a pobre coitada nem com pagamento o aceitaria.

Anita casou-se aos vinte anos.